Por Natanael Rinaldi
A expressão O GRANDE DESAPONTAMENTO é usada no livro Fundadores da Mensagem, editado pela Casa Publicadora Brasileira para caracterizar o fracasso profético de William Miller, que, baseado em cálculos cronológicos e com a passagem de Dn 8.14, anunciou, com grande estardalhaço, a segunda vinda de Cristo para 1843. Diz o livro:
“O movimento do advento na América foi originado por homens que estavam desejosos de receber a verdade, quando esta a eles chegasse. Aceitaram-na sinceramente e segundo a mesma viveram, esperando sendo dentro em breve transladados. Depois do grande desapontamento todos caíram em trevas.” (Fundadores da Mensagem, p. 9 - Everett Dick, CPB).
William Miller
William Miller nasceu em 1782, em Pittsfield, Estado de Massachussets, EUA. Era da família batista. Em 1818, ele começou a anunciar que Cristo voltaria à terra nos próximos vinte anos. Em 1816 estudando o livro de Daniel 8.14 interpretou que o texto tinha ligação com a segunda vinda de Jesus e a fixou para 23 de março de 1843. Depois mudou essa data para 22 de outubro de 1844 e ainda dessa vez a segunda vinda de Jesus não se consumou.
Interpretação de Dn. 8.14
“E ele me disse: Até duas mil e trezentas tardes e manhãs e o santuário será purificado.” Deduziu ele,
- Que o santuário a ser purificado seria a terra;
- Que a purificação se faria pelo fogo, concluindo que a terra seria purificada pelo fogo da vinda de Jesus, citando 2 Pe 3.9-10 como suposto apoio bíblico;
- Que as 2300 tardes e manhãs seriam dias, mas não literais, e sim dias proféticos, valendo cada dia por um ano com base suposta em Nm 14.34, Ez 4.6;
- Fixou como ponto de partida o ano 457 A C como data em que, segundo ele, se deu a ordem do rei Artaxerxes para a reconstrução da cidade de Jerusalém mencionada em Dn 9.25 e apontou Ed 7.11-26 como base bíblica desse decreto. Na verdade, a ordem do rei Artaxerxes de Ed 7.11-26 se referia à ornamentação do templo de Jerusalém e não ao decreto para a reconstrução da cidade. Daniel 9.25 aborda a restauração da cidade de Jerusalém.e não a ornamentação do templo da cidade de Jerusalém
- Quando não se deu a volta de Jesus em 1843 Miller aumentou mais um ano desta data. Isso foi sugerido por um seguidor, de nome Samuel Snow. Este argumentou que tinham decorrido apenas 2299 anos a partir de 457 A C. até 1843, acrescentando-se mais um ano à data anterior, ficando assim assentado definitivamente a nova data de 22 de outubro de 1844.
Como se Daria a Segunda Vinda de Cristo
O livro já citado, Fundadores da Mensagem, p. 39, indica que se dariam as seguintes ocorrências:
Que Cristo voltaria de maneira pessoal e visível, nas nuvens do céu, cerca de 1843;
Que os justos ressuscitariam incorruptíveis e os justos vivos seriam transformados pela imortalidade, sendo ambos levados juntos para reinarem com Cristo para uma nova Terra;
Que os santos seriam apresentados a Deus;
Que a terra seria destruída pelo fogo;
Que os ímpios seriam destruídos e seus espíritos conservados em prisão até sua ressurreição e condenação
Que o único milênio ensinado na Bíblia eram os mil anos que se seguiriam a ressurreição.
Ora, é possível imaginar o escárnio dos opositores contra os seguidores de Miller diante de tal fracasso profético! Foram zombados e – como disseram – desapontados. Entretanto, não é preciso conhecer muito a Bíblia para saber-se que ninguém está autorizado a marcar data para o dia da volta de Cristo.
“ Mas daquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos do céu, mas unicamente meu Pai.” (Mt 24.36)
“Não vos pertence saber os tempos ou as estações que o Pai estabeleceu pelo seu próprio poder.” (At 1.7)
Interpretação Bíblica
Entendemos que interpretação correta de Dn 8.14, “E ele me disse: “Até duas mil e trezentas tardes e manhãs; e o santuário será purificado” , é a seguinte:
O carneiro com duas pontas – Dn 8.3 representava o rei da Média e Pérsia – v. 20;
O bode – Dn 8.5 - representava o rei da Grécia – v. 21;
A derrota que o bode (rei da Grécia) infligiu ao carneiro (Média e Pérsia) – v. 7,8 representava a vitória da Grécia sobre a Média e a Pérsia;
Com a morte de Alexandre, representado pela quebra do grande chifre, e substituído pelos quatro chifres que saíram do bode – v. 8 – indica a divisão do reinado de Alexandre entre seus quatro generais – v. 22 (Ptolomeu, Seleuco, Lisímaco e Cassandro);
O chifre pequeno que surgiu de um dos chifres – v. 9 – (um rei feroz de cara) – v. 23 representava Antioco Epifâneo, v. 11-12;
Antíoco Epifâneo IV, governador da Síria entre 175 e 164 A C., profanou o santuário ou o templo de Jerusalém – v. 11 – e substituiu por sacrifícios pagãos de animais imundos e ídolos pagãos (1 Macabeus 1.21-24) os sacrifícios prescritos na lei (Nm 28.1-3);
O santuário ou o templo de Jerusalém foi purificado depois de 1150 dias (2300 vezes os sacrifícios diários celebrados de tarde e manhã foram suprimidos). (1 Macabeus 4.36-58)
Justificação Para o Grande Desapontamento
Os adventistas não gostam de ser lembrados pelo episódio do fracasso profético de William Miller. Procuram separar-se historicamente dele e dizem:
“Como admitir que William Miller fosse adventista se a Igreja Adventista do Sétimo Dia só foi organizada no dia 28 de setembro de 1860, portanto, alguns anos depois de Miller ter fixado a volta de Jesus para 22 de outubro de 1844?”
Chegam ao ponto de afirmar que “Os Adventistas nunca marcaram uma data para a Volta de Jesus. Foram os Mileritas (seguidores de Guilherme Miller, um pregador batista) que fizeram isto. Eles anunciaram que Jesus viria no ano de 1843; depois, deduziram que seria em 1844; como os Adventistas do 7º Dia iriam marcar uma data, se eles ainda não existiam? Surgimos como movimento organizado no ano de 1863.”
Outras vezes, reconhecendo que não podem esconder o passado, afirmam
“Somos adventistas do Sétimo Dia. Envergonhamo-nos, acaso, de nosso nome? Respondemos: Não! Não! Não nos envergonhamos.” No livro (Administração da Igreja p. 26, CPB)
Ora, por que haveriam os Adventistas do Sétimo Dia de se envergonhar de seu nome adotado em Assembléia realizadaem Battle Creek, a 28 de setembro de 1860? Só explicando pelos acontecimentos frustrantes de William Miller.
Afirmamos, pois, que os adventistas estão umbilicalmente ligados a Miller e foi ele que deu origem aos adventistas na outra América. No livro Fundadores da Mensagem, no capítulo que aborda a biografia de William Miller, ele é tratado como “ Pai do Movimento Adventista.”
Hiram Edosn
Não era de se esperar que esse movimento religioso chegasse ao fim com esses fracassos proféticos? Sim, era de se esperar O que houve que justificasse o prosseguimento do movimento adventista?
Para escapar do vexame da falsa profecia surgiu um seguidor de Miller, declarando que tivera uma visão corrigindo parte da interpretação de Miller. Chamava-se Hiram Edson que disse ter tido uma visão e passou a explicá-la:
“Vi distinta e claramente que o nosso sumo sacerdote, em vez de sair do lugar santo do santuário celeste, para vir à terra no dia do sétimo mês, ao fim dos dois mil e trezentos dias, entrava naquele dia pela primeira vez no segundo compartimento do santuário e tinha uma obra a realizar no lugar santíssimo antes de voltar a terra.” (Administração da Igreja, p. 20, CPB).
Com esta explicação, foi contornada a tormenta e os Adventistas do Sétimo Dia prosseguem sua existência religiosa. Com base nessa visão de Hiram Edson de que Jesus passou do lugar santo do santuário celestial para o santo dos santos em 22 de outubro de 1844, deu-se início a duas doutrinas consideradas fundamentais para eles: a do Juízo Investigativo e a do Santuário Celestial. Na verdade, como diz a Bíblia, “Um abismo chama outro abismo” (Sl 42.7) essas duas doutrinas não passam de duas heresias para uma Igreja que se ufana de ser a Igreja Remanescente (2 Pe 2.1-2).
Interpretação Particular da Bíblia
A sagacidade dos obreiros adventistas é tanta que hoje se utilizam de Ap 10.2,8-11 para justificar o erro profético ocorrido com a marcação de duas datas para a segunda vinda de Jesus. O texto bíblico declara:
“E tinha na sua mão um livrinho aberto. E pôs o seu pé direito sobre o mar, e o esquerdo sobre a terra; e clamou com grande voz, como quando ruge um leão; e, havendo clamado, os sete trovões emitiram as suas vozes. E a voz que eu do céu tinha ouvido tornou a falar comigo, e disse: Vai, e toma o livrinho aberto da mão do anjo que está em pé sobre o mar e sobre a terra. E fui ao anjo, dizendo-lhe: Dá-me o livrinho. E ele disse-me: Toma-o, e come-o, e ele fará amargo o teu ventre, mas na tua boca será doce como o mel. E tomei o livrinho da mão do anjo, e comi-o, o meu ventre ficou amargo. E ele disse-me: Importa que profetizes outra vez a muitos povos, e nações, e línguas e reis.”
Interpretam então que o gosto doce como mel, na boca de João, ao comer o livrinho que estava na mão do anjo, como sendo a mensagem da volta literal de Jesus para 22 de outubro de 1844, com base em Dn 8.14. Dizem,
“O anúncio da breve volta do Senhor em glória foi recebido com grande entusiasmo. Multidões de cristãos, os mais devotos, especialmente na América e Europa, tremiam com a mensagem, e, como profeta João, tomavam o livro e comiam-no. (Revelações do Apocalipse, p. 118-119, Roy A. Anderson, CP, 1988).
O gosto amargo do livrinho, no estômago de João, é interpretado como sendo o fracasso profético que causou o GRANDE DESAPONTAMENTO.
A Bíblia, porém, enfatiza que o reconhecimento do profeta verdadeiro se dá pelo cumprimento de suas predições. Quando isso não ocorre, é de se reconhecer que o profeta era falso e usou o nome de Deusem vão. Talcircunstância levava o profeta à morte por apedrejamento:
“Porém, o profeta que tiver a presunção de falar alguma palavra em meu nome, que eu não lhe tenha mandado falar, ou o que falar em nome de outros deuses, esse profeta morrerá. E, se disseres no teu coração: Como conhecerei a palavra que o SENHOR não falou? Quando o profeta falar em nome do SENHOR, e essa palavra não se cumprir, nem suceder assim; esta é palavra que o SENHOR não falou; com soberba a falou aquele profeta; não tenhas temor dele.” (Dt 18.20-22)
Não foi sem razão que Jesus advertiu: “Acautelai-vos, porém, dos falsos profetas, que vem até vós vestidos como ovelhas, mas, interiormente, são lobos devoradores.” (Mt 7.15)