Por Eguinaldo Hélio de Souza
Certos alimentos nos dão água na boca só de pensarmos neles. Comer é um verdadeiro prazer pelo efeito que os diversos sabores causam em nosso paladar. Sejam alimentos naturais como as frutas, ou preparados como tortas e pudins, trazem sensações que podem até mesmo viciar, tal seu impacto em nós. Ninguém despreza uma boa cozinha, seja qual for a sua nacionalidade. Doce, salgado, azedo e até amargo – os alimentos nos cativam de tal forma que boa parte de nossa vida gira em torno de uma mesa, de jantares a breakfasts. É um dos grandes prazeres que Deus concedeu ao homem.
Ainda assim, não comemos porque os alimentos são gostosos. Comemos porque não temos opção. Se não comermos, morremos. Há uma grande diferença em fazer algo porque é bom e fazer algo porque é necessário. Comeríamos e as vezes até comemos, apesar de um alimento não ser tão gostoso. A necessidade nos impulsiona. Não há alternativa. Ou melhor, a alternativa é a morte. Os prazeres gustativos podem facilmente nos levar a esquecer que comer não é apenas bom ou importante, é vital. Até o frescor da água e a pureza do ar não são os verdadeiros motivos para sorvê-los. Precisamos indispensavelmente deles. Eles também não são opcionais. São vitais.
Dentro desse contexto, fico chocado quando leio declarações como esta:
Sob hipótese alguma podemos analisar a diferença entre o cristianismo e as religiões por meio da fórmula “salvo ou não”, como era feito cem anos atrás. Não mais podemos raciocinar como, por exemplo, Hudson Taylor, cuja vida foi dominada por um pensamento que muitas vezes usou para chamar obreiros para o campo missionário: na China, morrem um milhão de pessoas a cada mês; todas elas estão perdidas porque nós não lhes anunciamos as boas novas. Não podemos mais usar este tipo de argumentação.[1]
Não podemos? Que quer dizer isso? Quer preguemos ou não o Evangelho, as pessoas não se perderão necessariamente? Existem outras opções? Ele é “um caminho” e não “o Caminho”?
O autor acima não nega a necessidade de fazer missões, mas nega a necessidade de missões. Não diz que não se deve pregar o Evangelho, todavia, retira sua única motivação. Não pregamos o Evangelho porque ele é bom. Pregamos porque é necessário. Não é um remédio entre muitos para o problema humano. É a única cura.
Por que sair de nossa terra, de nossa família, de nosso conforto e habitar no meio de um povo estranho, em condições difíceis, correndo o risco de ser descoberto e morto? Para fornecer um medicamento que pode ser facilmente encontrado em nosso local de destino? Temos apenas um bom produto (ou o melhor) em meio a tantos outros produtos? Não me parece motivador.
O Evangelho não é primeiramente paz, amor, alegria, cura. Não é um culto terapêutico e sentimentos pessoais.[2] É o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê (Rm 1.16). Na verdade é a única salvação unicamente para quem crê. Os benefícios do Evangelho não são a razão para pregá-lo e levá-lo ao mundo. Restauração física, psicológica, social e familiar pode resultar da aceitação da mensagem, mas não é esta a razão de sua proclamação. Ele deve ser proclamado porque é vital, porque não há escolha, porque sem ele o ser humano está eternamente perdido. Não importa se ele é doce, salgado, azedo ou amargo. O importante é que somente nele o homem pode encontrar a salvação. Sem isso o homem está perdido. Como disse um apologista, ou o Cristianismo é TUDO para a humanidade, ou ele não é NADA. Ou é a maior das certezas ou a maior das ilusões…[3]
Esta verdade criou mártires e heróis. Mobilizou milhões que semearam a verdade nas ilhas e continentes. Se hoje há uma multidão de adoradores entre as nações, reconhecendo que o nome do Senhor é tremendo desde o nascer do sol até o seu poente foi porque as gerações anteriores entenderam que o Evangelho era uma necessidade, não uma boa opção. Não valeria a pena arriscar-se tanto, por maiores que fossem os benefícios, mas valia a pena renunciar tudo pelo tudo.
Podemos aceitar que existe sinceridade e sinceros em todas as religiões. Podemos até mesmo admirar princípios éticos nas grandes religiões universais. Entretanto, a verdade salvadora só existe em Jesus. Sem isso o Evangelho não passa de uma alternativa entre outras, um alimento ingerido apenas pela curiosidade e não pela necessidade, um produto descartável e dispensável, ao invés de ser a porta pelo qual o homem precisa passar para ser salvo.
Se o Evangelho não passa de mais uma opção, para que pregá-lo? Se não há outra opção, como não pregá-lo?
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Notas:
[1] FREYTAG, Walter. O fator demoníaco das religiões (artigo). São Paulo: Vida Nova, 1992. P.10
[2]OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. São Paulo: Vida, 1999.p. 17
[3] MCDOWELL, Josh. Evidência que exige um veredicto. São Paulo: Candeia, 1996. P. 2